Entre quase 4 mil pessoasenvolvidas com o tráfico de drogas entrevistadas em uma pesquisa do Instituto Data Favela divulgada nesta segunda-feira (17), a maioria (58%)gostaria de deixar voluntariamente essa condiçãocaso pudessegarantir o sustento econômico e a estabilidade pessoal.

Em contrapartida, ao responderem a pergunta “Se você tivesse uma oportunidade de deixar o que faz hoje no crime, você sairia?ˮ, outros 31% disseram que não sairiam desta situação.
Esses dados fazem parte da pesquisa Raio-X da Vida Real, realizada pelo instituto, que é ligado à Central Única das Favelas (CUFA), no período entre 15 de agosto de 2025 e 20 de setembro de 2025, em favelas de 23 estados.
Ter condições de abrir o próprio negócio seria o atrativo necessário para deixar o crime na avaliação de 22% dos entrevistados, enquanto 20% apontam um trabalho com carteira assinada.
Apesar de a maioria dos entrevistados em nível nacional responder que sairia do crime, a análise por estado traz algumas situações diferentes. No Ceará, 44% não deixariam o crime se pudessem, enquanto 41% sairiam.
No Distrito Federal, a diferença é ainda maior: apenas 7% disseram sairiam, enquanto 77% permaneceriam. Em Minas, foram 40% dizendo que deixariam a situação, e 57%, que não.
Remuneração
Conforme a pesquisa, a remuneraçãoé o principal motivo para a permanência no crime. 63% dos entrevistados declararam que recebem até dois salários-mínimos (R$ 3.040) mensais na atividade criminal, sendo que a renda média mensal é de R$ 3.536,00. Para 18%, não sobra dinheiro no fim do mês.
“A maior parte deles está colocada nas faixas mais baixas de renda, e isso puxa a média para baixo”,apontou diretor técnico do Instituto Data Favela e cientista político, Geraldo Tadeu Monteiro, durante entrevista de divulgação da pesquisa transmitida no canal da CUFA no Youtube.
“Com mais dinheiro, se revela uma grande armadilha, porque, na verdade, o custo-benefício de entrar no crime acaba sendo muito pequeno, uma vez que as pessoas acabam recebendo pouco entrando em uma vida de muito risco e dificuldades”.
Entrada no crime
A falta de uma situação econômica mais favorável é também o motivo declarado pelos entrevistados para a entrada no crime.
“Exatamente porque recebem pouco dinheiro, essas pessoas entram, por necessidade econômica, acreditando que aquele dinheiro vai ser suficiente para uma vida melhor, e logo descobrem que não é bem assim”, completou o diretor técnico.
O estudo mostrou que essas pessoas procuram outra atividade simultâneapara complementar renda. De acordo com os dados, 36% dos que responderam ao estudo disseram que possuem alguma outra atividade laboral remunerada, provavelmente em razão dos baixos ganhos nas atividades ilícitas, disseo instituto.
“42% dos entrevistados disseram que fazem bicos. A gente percebe que é uma atividade esporádica, em geral mal remunerada”, informou, acrescentando que, na sequência, 24% responderam que partem para empreendimentos como uma barraquinha de alimentação e até oficina mecânica.
Os números mostraram ainda que 16% desenvolvem trabalhos com carteira assinada em paralelo ao crime, 14% ajudam em empreendimentos de amigos, e 3% em algum projeto social.
Entrevistas
Das 5 mil entrevistas presenciais, realizadas nos locais onde se desenvolvem as atividades criminosas do tráfico de drogas,3.954 foram consideradas válidas. Foi respondidoum questionário de 84 perguntas, eos percentuais obtidos têmmargem de erro de 1,56 ponto percentual, com nível de confiança de 95%.
“Trata-se do maior levantamento já conduzido com pessoas em situação de crime (tráfico de drogas) em atividade, trazendo dados sobre perfil, renda, trajetória, saúde, profissão, sonho, família, saúde, e consumo e expectativas”, informou o Data Favela.
Perfil
O Raio-X da Vida Real indicou que 79% dos que responderam a pesquisa são homens, 21% mulheres, e menos de 1% se declarou LGBTQIAPN+.
- 74% são negros;
- 50% são jovens entre 13 e 26 anos;
- 80% nasceram e cresceram na mesma favela;
- 50% têm companheiro (a);
- 70% são de religiões de matriz africana, católica ou evangélica;
- 52% têm filhos;
- e 42% não completaramo ensino fundamental.
A mãe é a figura mais importante para 43% dos entrevistados, e junto deavós, tias ecompanheiras, asreferências femininas chegam a 51% dos vínculos afetivos mais citados. Já para 22%, as figuras mais importantessão filhos ou filhas.
Além disso, 84% afirmam que não deixariam um filho entrar para o crime.

